fevereiro 02, 2007

"- Essa história é baseada em fatos reais"

Diários de conquista I

Era uma sexta-feira, fim de expediente, a hora já estava avançada, mas fim da semana é assim, tudo fica acumulado. Clara, mais velha, já beirando os 30, trabalhara incessantemente num projeto que iria concorrer a um financiamento, Emily que a acompanhava na volta para casa tinha vinte e poucos anos, estagiária, estudante de jornalismo, estava esgotada pois fechar a redação é difícil pra todos, e ela estava exausta.

Pegaram o mesmo ônibus, quase não falavam, o que era raro, as duas sempre encontravam assunto para tagarelar horas a fio, sentaram no coletivo, cansadas... só tinham forças para reclamar do cansaço, dos prazos, mas um sentimento de tarefa cumprida era nítido... saíram de Botafogo, passaram pelo Flamengo, Glória, quando passaram pela Lapa, as cores brilhavam ao longe, eram muitas luzes, e como duas mariposas à noite atraídas por aquela sedutora luminosidade, olharam uma para a outras e disseram ao mesmo tempo “vamos?” a resposta veio de imediato: “vamos!”

Desceram do ônibus num rompante, enquanto atravessaram as ruas tomaram os seus celulares em punho e ligaram para as suas casas, avisando do possível atraso, ou da ausência naquela noite. O que fazer agora? O mundo pertencia a elas duas, pra onde ir, com quem ir, o que beber, precisavam de uma dose de álcool, mereciam comemorar toda aquela semana árdua de trabalho, elas mereciam uma noite de relax total. Sentiram-se enfim, livres.

Entraram num bar da moda. Clara pediu uma caipirinha e Emily um chopp, começaram a rir da situação, era a primeira vez que faziam um programa noturno juntas, em outros tempos eram só amigas de ida e volta para a casa ou almocinhos nos shopping próximo a empresa que trabalhavam... As bebidas não tardaram a chegar, o bar estava lotado de gente do tipo alternativa, rapazes barbudos, meninas que usavam saias amassadas de cinturas baixas e sandálias rasteiras, típicos freqüentadores da Lapa.

Estávamos um tanto outsiders, com roupas de escritório, meio arrumadas demais para o clima daquele lugar, mas e daí, quem se importa?

Clara naquele dia havia comprado o jornal, nunca faz isso, não é de seu hábito ler jornal, ela os considera muito partidários e sujos, odeia aquela poeira da tinta que sai do papel, prefere manter-se informada através de revistas e jornais publicados na Internet, mas naquele dia, parecia que estava adivinhando que haveria seria diferente e poderia precisar de uma dica para a noite, e foi o que aconteceu.

Havia duas possibilidades, Fundição Progresso que teria Monobloco como atração ou então Clube dos Democráticos, onde haveria a Roberta Sá cantando marchinhas de carnaval. Emily preferiu a primeira opção, e Clara a segunda. Foram para o Democráticos.

Chegaram cedo, o lugar grande demorava pra encher, resolveram sentar, pedir algo para comer... batata-frita, claro. Clara logo que olhou para o lado avistou alguns conhecidos dos tempos da faculdade, sentaram-se todos juntos e falação tomou conta da mesa.


Quando de repente, as luzes do palco se iluminam, o lugar continuava vazio, a maioria das pessoas estava sentadas, e só de ouvia o zum-zum-zum animado das conversas, uma espécie de torre de babel, todos se entendiam, e ninguém discernia nada...

Clara percebe um rapaz a fitando, ele não se aproxima, passa de um lado para o outro com olhar fixo no dela, dando a impressão que os dois já se conheciam, ela lembrou dele. Haviam se conhecido no Circo Voador tempos atrás, coisa de pouquíssimos meses, no show do Alceu Valença. Ela riu e ele também, de longe.

Emily logo percebeu o que estava acontecendo e indagou a amiga... que contou prontamente. Emily vibrou com a situação uma vez que Clara tinha acabado de sair de um relacionamento penoso e se dar uma chance para uma nova conquista parecia ser no mínimo, muito saudável, uma forma de mostrar que as coisas já estavam se ajeitando. Apesar da alegria evidente no rosto de Clara no seu dia a dia, ela tinha sofrido muito, somente as amigas confidentes sabiam o que se passava no interior de Clara: dor, tristeza, decepção e uma sede por liberdade.

Por causa desse sofrimento tão recente, Clara sempre suspeitava de quem se aproximasse dela com intuito de conhecê-la intimamente, uma forma de defesa e auto-proteção em tempos de selvageria sentimental. Realmente se envolver não estava em seus planos.

A música começa a tocar, e as pessoas do lugar continuam nos seus assuntos de mesa de bar, animação e filosofia barata, acompanhados por cerveja e batata-frita. A mesa de Emily e Clara não poderia ser diferente... eram muitas gargalhadas e expectativas com o show que haveria de acontecer em poucos minutos. Quando Clara se dá conta, o sujeito está sentado em uma mesa em frente a dela, estava ele na reta do seu campo de visão,

Ele a encarava objetivamente, ele a desejava e ela percebia e gostava do jogo de sedução... até onde haveria de chegar ela não fazia idéia, mas interessou-se pela forma como tudo estava sendo conduzido...nem tanto por tê-lo achado atraente, isso ele não era, mas o que lhe chamou atenção foi o topete do rapaz de tê-la desejado, no fundo ela ouviu tudo o que ele queria dizer através daqueles olhares, uma telepatia genuína.

Quando Clara decide enfim dividir a telepatia com a amiga, ele levanta e caminha em sua direção, estende o braço e manda “você me daria o prazer de abrir a pista de dança comigo?” Ela não pensou duas vezes, foi.

Eles começaram a dançar em silêncio, ela tinha medo de errar o passo e prestava atenção nos movimentos do parceiro de dança, quando começaram a conversar, ele puxou conversa e ela contou que havia se lembrado dele do show do Alceu... ele ficou abismado com a memória dela, porque já havia se passado mais de 5 meses, sim, ela lembrou perfeitamente... descreveu a roupa que ele trajava, ele riu e acreditou assim que ela realmente falava a verdade.

Dançaram a noite toda, viraram parceiros de dança e contra-dança, Clara permaneceu anestesiada, estava se divertindo, não por ele, mas por ela... ela estava num clima ótimo e a companhia era somente um detalhe, mas uma vez disseram que a beleza está nos detalhes, então, num esforço descomunal, percebeu que precisava captar cada imagem, cada palavra, cada passo de dança, porque só assim ela poderia um dia contar essa conquista, como estou fazendo agora.

Clara fica receosa de beijar-lhe a boca, ele tenta, pede, tenta convencer... ele a chama de irresistível, ela nem concorda tanto mas gosta, se acha bonita, mas não a ponto de ser irresistível. No entanto, o clima contagia... suor, música, corpos... ela cedeu. As línguas invadem assim as bocas um do outro, saliva com gosto de cerveja e suor, delirantemente gostoso. Os corpos permanecem em movimentos, passos marcados embalam o beijo que demorou quase uma noite inteira para acontecer...

A dificuldade que ela impôs faz com que tudo seja mais valorizado, ela quase não fala dela ao longo da noite, a boca permanecia ocupada demais, e palavras não combinam com música alta, prefiria ouvir e deixar-se levar... e assim fez até o sol raiar.

Amanheceu e as duas voltaram para o seu roteiro de origem, voltaram para casa às 7h da madrugada, pegaram o ônibus que deveria tê-las servido na noite anterior. O sentimento de dever cumprido ainda pairava em suas mentes, só que agora somada a expectativas de duas novas conquistas, sim, Emily também teve sua boca invadida por uma outra língua, uma língua alheia.

Combinaram de fazer muitos programas como aquele. Não ligaram para o cansaço, não se importaram de passar uma noite em claro, porque uma noite perfeita como aquela merece uma repetição. Merece um bis... bis, bis, bis.

Um comentário:

Diogo Lyra disse...

eu também preferiria ver a roberta sá...